Para sempre ou até que a morte nos separe.... vamos ler Dante Alighieri?

Dante Alighieri considerado pai da lingua italiana 



A Divina Comédia  Inferno de Dante  As estrelas 

Por Flavia Wass jornalista

“Um livro escrito 700 anos atrás, a Divina Comédia, criou uma visão de inferno que ainda temos hoje, é um livro poderoso”, descrição feita pelo  escritor Dan Brown, autor do Código Da Vinci, contando da sua experiência ao escrever Inferno, a saga de Robert Lagdon em busca dos enigmas da ciência no cenário de Dante Aliguieri. Segundo o autor, Dante ajudou a igreja, com a sua descrição detalhada das punições para cada tipo de pecado. Inclusive, para ele  “a visão do inferno, pode motivar as pessoas a mudarem suas vidas e se tornarem melhores. Por outro lado, há um fascínio interior que sentimos em relação ao lado obscuro, o qual existe dentro de nós e um medo que ele possa dominar o lado bom e fazer com que nos tornemos alguém que não queremos ser”. Talvez, por esta razão o Canto V, início desta obra, que continua com o purgatório e paraíso suscite tanta curiosidade e tenha inspirado tantos artistas a desenharem, pintarem, recitarem ou representarem este contexto.  Ao longo desta análise, pinturas de Gustave Dorè (ilustrador da Divina Comédia), Wiliam Blake (pintor e poeta Inglês século XVIII) e Salvador Dali (1950) poderão ser observadas. Estes retrataram o inferno dantesco, seguindo suas impressões e acompanhando as características peculiares a cada época.
A Divina Comédia é uma obra muito importante para a análise do imaginário medieval. Nela, Dante expõe seus sentimentos (o amor por Beatrice), o contexto político de Florença, a cultura e o medo do Satã presentes em sua época. Dante também expõe sua admiração por figuras como Virgílio, que é para ele o símbolo da sabedoria humana e precursor da Era Cristã, e também demonstra reprovação quanto às condutas pecaminosas de personagens da Antiguidade,  personagens do cenário medieval e de florentinos, tanto os ligados à política quanto  à Igreja. Dante demonstra essa reprovação condenando-os ao castigo eterno, fruto do pecado e da justiça divina.

Uma viagem mística, religiosa e repleta de elementos alegóricos em um cenário chamado Baixa Idade Média. As alegorias fazem com que as imagens sejam a contracara de significados alegóricos. O mundo era um livro escrito por Deus. Onde tudo é representado por signos. Assim, as alegorias fazem destas imagens signos de uma linguagem religiosa e do mundo cristão. Por exemplo, um “bosque” tem sempre atrás um significado religioso, neste caso aportar os homens do pecado, a necessidade da aproximação de Deus. O fim da obra é escatológico levando o homem à salvação. Seguindo esta lógica, o lugar do homem no universo é o mais próximo possível de Deus, ou seja, circunscrito à Deus. Uma doutrina para repensar a espiritualidade, portanto, o horizonte medieval não se entendia sem Deus. Marcado pela ideia de Deus. Por isto, esta viagem espiritual de Dante, para que aquilo considerado hegemônico venha a ser discutido.
O canto V, o inferno é o início da viagem. Amor e erotismo construído todo em um universo, onde Dante vivia seu exílio, pois foi expulso de Florença. Através de um golpe, os Negros retomaram o poder e ocuparam o governo de Florença. Os Negros condenaram vários Brancos ao exílio e à morte. Dante foi culpado de várias acusações, sendo banido da cidade por dois anos e condenado a pagar uma alta multa. Dante passou seu exílio em Forlì, Verona, Arezzo, Veneza, Lucca, Pádua e provavelmente em Paris e Bologna. Voltou a Verona em 1315 e, dois anos depois, se fixou em Ravenna, onde morreu e foi sepultado, em 1321. A Comédia consumiu 14 anos da vida de Dante e durou até a sua morte. Dante tinha amigos da retórica latina que o auxiliam na visão renascentista e humanista do Eu poético, uma voz poética e o ajudam a criar um personagem dele mesmo. Uma aventura individual que faz uma viagem religiosa.
 O ambiente acontece no segundo círculo, descendo e é descrito um lugar cheio de dor, onde reina a escuridão, o lamento, o pranto, a amargura e o sofrimento.
“onde o pungir da dor é mais profundo”, cita desde o início.
O poeta usa advérbios de intensidade para descrever com ênfase o desassossego das almas condenadas. “Rugia como faz mar combatido”. Vento, tufão e turvilhão estão presentes, assim como barulho. “Quais almas são aquelas que o vendaval fustiga denegrido”. Usa signos, sinais e alegorias como representação desta realidade. “De luxúria fez tantas demasias, que lei dispôs ser lícito e agradável, para desculpa às torpes fantasias”. A rainha da luxuria, neste caso, seria Dido. Ao final, “e tombei, como tomba corpo morto”.
Os protagonistas no canto V são Francesca e Paolo, cunhados que se apaixonam lendo a história de Lancelot e Guinevere, por tanto adúlteros. Por outro lado, Dante é um personagem narrador, o escritor cria um personagem dele mesmo, o eu poético, a voz poética numa aventura individual,  que faz uma viagem religiosa durante toda Divina Comédia. É acompanhado por seu amigo Virgilio na sua jornada ao inferno, o escritor de Eneida. Neste momento, Dante ouve o drama da protagonista Francesca e todos os  personagens servem de contraponto ao dilema e sofrimento vivido pelos protagonistas.  Minos aparece na entrada do inferno, Semiramis esposa do sultão Ninos. Cleópatra, a rainha do Egito, os gregos Helena e Páris, Aquiles e Tristão. Inclusive, Dido a rainha de Cartago, que comete suicídio ao ser rejeitada por Enéas, em Eneida, aparece neste canto V.
O Inferno, no canto V tem vento, é um turbilhão, muito barulho e não tem chamas. A espiral que acompanha a viagem é o pecado, adultério e a  luxuria. Enfim, a visão do amor como pecado. No verso 37 fica clara a transgressão carnal, onde desafia a razão. O pecado do amor levado até o corpo. Uma visão cristã do amor e das relações amorosas.Dante, neste momento, encontra diferentes personagens da antiguidade e mulheres famosas dos clássicos literários, ligadas à luxuria: a rainha Dido, Semíramis, Cleópatra, Helena, Aquiles, Páris, Tristão, Francesca da Rimini e Paolo. Dante, também encontra no Inferno muitos florentinos. Entre eles Brunetto Latini, seu mestre predileto.
Depara-se com inimigos e aliados políticos como: Azzolino e Loderingo de Landolo, guibelinos; Obizzo de Esti, ardoroso guelfo; Vanni Fucci, guelfo negro, Filippo Argenti, nobre florentino adversário do poeta e Farinata, nobre florentino e chefe do partido guibelino.
Alguns dos personagens que Dante encontra no Inferno lançam agouros sobre ele. Esses agouros são fatos relacionados à vida política do autor. Visita no inferno as grandes pecadoras e diferentes mulheres da tradição clássica. No verso 61, Dido,  a rainha que, para obter seu amor não se submete às regras da razão.
Dante consegue falar com a protagonista Francesca e  o leitor pode ouvir esta personagem. Dante quer falar com Francesca e Paolo estas duas sombras em pecado, com a função de sublinhar estas metáforas amorosas. Pode-se sentir o afeto de Dante pelo caído de Francesca, adultera e digna de piedade. Mas, não a julga, não a condena e nem a rejeita. Francesca não se arrepende e não é capaz de separar-se da alma de Paolo. Impossibilidade de se opor às forças do amor. No verso 100, não pode escapar do amor. Relação de cunhados, ele Paolo com o irmão de Francesca. O amor que sai do livro e faz alusão à Lancelot, um romance de cavalaria, o qual precede os cantos de gestas. O canto V é uma visita literária no gênero. Enfim, um gênero religioso que visita outro gênero. Duas personagens lendo um romance de cavalaria. Este amor surge do livro Lancelot. Amor que não provém da experiência e sim da forma livro.
Ela, Francesca é a Dama superior, quem fala, ele se atreve a dar um beijo nela. Lembra a tradição provençal, amor literário entre personagens nobres, amor erótico. Dante dialoga com a tradição dos trovadores que dialoga, por sua vez com o romance de cavalaria, falando em formas poéticas, como o amor se expressa na linguagem.
No verso 121, cena de leitura. Vínculo de piedade de Dante para com Francesca. A  literatura, neste caso, cria realidade. E por sua vez, ressalta a marca e poder da literatura. Amor é uma criação da linguagem dos trovadores medievais. Francesca conta uma cena deste amor cortês. A obra, então, faz uma viagem por diversos modelos literários.  Um poder feito de letra e poesia e não amor como experiência. E com tal forma, consegue tocar o coração da humanidade, atravessando os séculos. 

" Nesses pecadores de pungente humanidade, nós nos reconhecemos infinitamente: como eles, vivemos à beira do abismo, e esse abismo nos fascina e nos atrai. A culpa existencial não é invenção da civilização cristã - já está presente nas tragédias gregas e nas lendas do antigo Egito. Outro tema imortal é a esperança na redenção: e por isso não se pode compreender a Comédia de Dante apenas através do Inferno. À medida que avança, passo a passo, rumo ao coração das trevas, onde o próprio Lúcifer está acorrentado numa horrenda geleira subterrânea, Dante tem o pensamento constantemente fixo em seu iminente encontro com Beatriz - o único Paraíso concebível. Essa é a grande metáfora da Comédia: como Dante Alighieri, caminhamos na sombra, mas com os olhos fixos no céu estrelado. E por isso compartilhamos seu fantástico alívio quando, após encarar o Diabo em pessoa, ele se esgueira pela saí­da do Inferno e volta à superfície da terra, coberta pela simples beleza da noite: 
Subimos, Virgílio à frente, eu atrás; pela boca da caverna, espiei as coisas belas que giram pelo céu. E então saímos, finalmente, para ver as estrelas." (citação fonte editora Abril site educação) 


Agradecimento à professora Silvana de Gaspari Disciplina Literatuta I Universidade Federal de Santa Catarina UFSC



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