Artigos, Crônicas e Publicações
A Ruína da
sociedade na busca de uma eficiência infinita.
*Flavia
Wasserman
Resumo: O artigo
relata o experimento “Buraco no Muro”, feito por um colaborador de uma empresa
estabelecida na Índia, em uma favela de Nova Dehli e filmado por um
cinegrafista, que pesquisava sobre a pobreza global. Confronta e questiona a
validade desta ação, o quanto isto será válido para as crianças em nível de inclusão,
formação e educação. Uma sociedade arruinada pela constante busca da eficiência
infinita. A tecnologia ajudaria na transformação daquela realidade ou estaria,
na era da reprodutibilidade, aumentando os “ratos” deste imenso laboratório?
Palavras chaves: Experimento, empresa Índia, pobreza,
inclusão, social, educação, laboratório, ruína, sociedade, eficiência.
Abstract: This
paper reports an experiment done by an employee of a company established in
India in a slum in New Dehli and filmed by a cameraman who was researching
about global poverty. Confronts and questions the validity of this action, as
this will be valid for these children to the level of inclusion, training and
education. In a society in ruins, and the constant pursuit of infinite
efficiency. How much technology would help in the transformation of that
reality, or was, in the age of reproducibility, increasing the "rats"
this huge laboratory?
keyword: Experiment, company India, poverty,
inclusion, social, education, laboratory, ruin, society efficiency.
* mestranda
no Programa de Pós Graduação em Literatura PPGL da Universidade Federal de
Santa Catarina.UFSC Disciplina Ruínas. Professora Ana Luiza Andrade.
“Para o gênio,
toda e qualquer cesura, os pesados golpes do destino como o suave sono, cai na
industruosidade da sua própria oficina de trabalho. E o círculo de sortilégio
dela, ele o traça no fragmento", descreve Walter Benjamin o que seria
hoje, o antagônico à sociedade do imediatismo, o homem comum, pós-moderno
remando contra a maré do decadentismo industrial e de uma sociedade comprimida,
atulhada, exprimida, caótica pela busca frenética por "bens" que
façam o "bem" e lhe forneça o "conforto". Neste fragmento
de pensamento, que Benjamin intitula Relógio Normal, “para os grandes as obras
acabadas tem peso mais leve que aqueles fragmentos nos quais o trabalho se
estira através da sua vida. Pois, somente o mais fraco, o mais disperso
encontra sua incomparável alegria no concluir e se sente com isto devolvido à
sua vida”.
A exemplo do poema
de Carlos Drumond de Andrade, Verbo Ser, quando questionado à criança: que vai
ser quando crescer a induz a inúmeras dúvidas: tenho de mudar quando crescer?
Usar outro nome, corpo e jeito? Ser; pronunciado tão depressa, e cabe tantas
coisas, ou seja, a reduz ao modelo tecnicista ou à busca frenética da
eficiência infinita, moldada e saída direto da fábrica. Assim como, para
Benjamin Gênio é industriosidade, ou seja, um construir contínuo, Drumond
também, conclui o poema optando por este trajeto ao “não ser nada”: - Não dá
para entender. Não vou ser. Vou crescer assim mesmo. Sem ser Esquecer! Um modo
de lançar-se ao infinito de Giordano Bruno, filósofo no século XVI, vitima da
inquisição ao tentar provar que o universo seria dinâmico, assim como as
pessoas, e estariam em constante transformação gerando vínculos e mais relações
e por isso mesmo em expansão. Em obra intitulada, Acerca do infinito, universo
e os mundos afirma sua teoria contrária ao mundo fixo de Aristóteles.
"Nós declaramos esse espaço infinito,
dado que não há qualquer razão,
conveniência, possibilidade, sentido ou
natureza que lhe trace um limite.”.
(1584, Bruno Giordano)
Séculos luz à frente desta constatação, ao inverso do
que se possa imaginar, que avanços nesta direção bruniana, aconteçam ou estejam
superados em sociedades capacitadas, desenvolvidas e avançadas, não se
concretiza de fato. Pois, na prática o que se vê são formigueiros de indivíduos
abarrotados por afazeres cotidianos catando nos escombros do materialismo um
lugar de “status” ao sol, literalmente, quadrado porque olhado sempre sob esta
perspectiva limítrofe. Portanto, torna-se
cada vez mais difícil, o olhar além, do metro constituído e enquadrado. Talvez
a arte cumpra esta função na metrópole: desestabilizar, extirpar as referências
usuais, as quais faça abrir uma fenda no chão deste sujeito amortecido por
tornar tudo “banalidade”.
A obra de arte ’paisagem’ surge como a gradual
continuação e purificação do processo em que a paisagem - na acepção
do uso linguístico comum - sobressai da pura impressão
das coisas
naturais singulares. O que o artista faz - extrair da
torrente e da
infinidade caóticas do mundo imediatamente dado um
fragmento,
apreendê-lo e formá-lo como uma unidade, que agora
encontra em
si mesma o seu sentido e intercepta os fios que a
ligam ao universo
e os reata de novo no ponto central que lhe é
peculiar.
(Simel, George. pg 09, A filosofia da paisagem)
.
Mas, é em uma comunidade carente na Índia, aonde nem o
asfalto chegou, ainda, cujos contrastes vêm à manivela num chão corroído pela
miséria. É ali, um buraco na parede e uma ideia para aproximar crianças, que não
teriam possibilidade nenhuma de ter acesso ao que acontece no mundo ou conhecer
a tecnologia, que foram atraídas por este “esburacamento” inusitado em um muro.
Um lugar inóspito, a esmo e sem atrativos, somente aquela fenda na pedra, uma
luz brilhando e um toque com o dedo, fez alcançarem mundos antes impossíveis de
serem visualizados. Sem ajuda nenhuma, escolaridade ou auxílio de um adulto,
enxerga e vai além dos seus limites. Mesmo porque, são desprovidas de aparatos
designados ao estimulo cognitivo. E usam o que Benjamin denomina Canteiro de
Obra.
... as
crianças são inclinadas de modo especial a procurar todo e qualquer lugar de
trabalho onde visivelmente transcorre a atividade sobre as coisas. Sentem-se
irresistivelmente atraídas pelo resíduo que surge na construção, no trabalho de
jardinagem ou doméstico, na costura ou na marcenaria. Em produtos residuais
reconhecem o rosto que o mundo das coisas volta exatamente para elas, e para
elas unicamente. Neles, elas menos imitam as obras dos adultos do que põem
materiais de espécie muito diferente, através daquilo que com eles aprontam no
brinquedo, em uma nova brusca, relação entre si. Com isso as crianças formam
para si seu mundo de coisas, um pequeno no grande, elas mesmas.
Mais que isto, mesmo em meio à guerra, esta mesma
criança indefesa encontra no esfacelamento daquela realidade algo, um pedaço de
ferro, uma pedra, um plástico retorcido brilhoso e colorido, que a distraia e
cancele, ao menos por um momento, sua completa solidão em meio aos estilhaços,
aos restos destroçados desta calamidade. No entanto, bilhões de pequenas
comunidades vivem em situação de “guerra” não declarada no mundo. O exemplo
deste cinegrafista, que vai à Índia para dirigir um filme sobre a pobreza
global e depara-se com a realidade de um bilhão de pessoas vivendo entre
escombros, ou seja, vivem naquele local. Apenas, um quarto delas tem acesso à
água potável e limpa, sendo que, metade é analfabeta.
Contudo, numa favela em Nova Dehli fica surpreso com a
cena: um computador encaixado num muro rodeado de crianças em volta. Aquele
artefato tinha sido colocado ali pela Companhia NIIT, que fica ao lado. Mesmo,
com a extrema pobreza da Índia, paradoxalmente, é também sede de algumas firmas
de alta tecnologia mais avançadas do mundo. O chefe de pesquisa e
desenvolvimento desta empresa, em questão, resolve empreender paralelo ao seu
trabalho, a tarefa de educar crianças pobres. “Transpor o que vem sendo chamado
de “fronteira digital”, é uma tarefa importante, significa que todos devem ter
acesso”, justifica Mirtra.
Em 1999, iniciou este experimento, que passou a ser
conhecido como “O buraco no Muro”. Conecta um computador de alta velocidade à
internet e o colocou em um muro que separa a sede de sua empresa da favela. E
começa a observar o início de seu manuseio. Como numa peça de teatro, ou
espectador de um filme e sem pagar ingresso. ''A
cega vontade de salvar o prestígio da existência pessoal, de preferência a
destacá-la, pelo menos, através da soberana avaliação de sua impotência e de
seu embaraço, do pano de fundo do enceguecimento geral, impõe-se quase por toda
parte. '' (BENJAMIN, 1993, p.24) Inesperadamente,
crianças curiosas surgiram de toda parte e foram imediatamente atraídas pelo
computador. Educados, perguntaram se podiam tocá-lo e ele responde, “sim, está
do seu lado do muro.” De imediato, estipula a regra ao dizer, que tudo o que
estivesse do lado deles “do muro” podia ser tocado.
Sem exitar, começaram a manusear com o objeto
estranho. Levou alguns minutos para que descobrissem como apontar e “clicar”.
Ao final do dia, estavam navegando. Então, foi dada uma oportunidade de acesso
e as crianças apreendem o rudimentar da
linguagem daquele aparelho. Olham para a câmera do cinegrafista, contando com
entusiasmo, a façanha de terem captado sozinhas. Spielberg,
no filme Inteligência Artificial, revela desdobramentos do processo de tecnificação e
da dimensão virtual que os brinquedos apresentam na contemporaneidade. Este
filme nos fala da memória pré-fabricada e manipulada, metaforizada no
funcionamento do ''menino-robô'', programado a partir de algumas
palavras-chave, dimensão do ''humano robotizado'', onde, para
''funcionar-existir'', bastam algumas senhas. O culto às imagens e ao
artificial povoa o filme, gestando, passo a passo, o esquecimento e a anestesia
social. Não há lugar para as palavras, o corpo, as relações, as histórias.
Universo programado e artificializado, busca na mimesis a superação do humano,
da falta, pela via da tecnologização avassaladora. As paisagens das janelas são
mimetismos da natureza, imagens que apagam à memória o que está fora (MEIRA,
2001).
Usam a palavra “brincando”, quando se referem ao ato
de manuseá-lo. Satisfeitos, frisam, que apreenderam uns com os outros. Numa
integração visível, entre eles, “brincaram”, descobriram os “jogos”, mencionaram
o termo “uso de ferramentas”, “internet” e site da “Disney”. ''Conhecemos muito bem alguns instrumentos de brincar
arcaicos, que desprezam toda máscara imaginária (possivelmente ligados na época
a rituais): bola, arco, roda de penas, pipa – autênticos brinquedos, ''tanto
mais autênticos quanto menos o parecem ao adulto''. Pois quanto mais atraentes,
no sentido corrente, são os brinquedos, mais se distanciam dos instrumentos de
brincar; quanto mais ilimitadamente a imitação se manifesta neles, tanto mais
se desviam da brincadeira viva. '' (Idem, p. 93) O primeiro a “navegar”, conta sua aventura ao visitar um “site de
notícias e que leu sobre o talibã e Bin-Laden, líder da Al-Qaeda. Impressionado, relatou ter lido, que existe sim, uma
guerra entre a América e o Talibã, usando aviões e bombardeios. Embora, não
fosse novidade, pois tinha visto antes na televisão e, agora, comprovava vendo
as fotos das bombas explodindo na tela do computador. Até aquele instante, não
sabia, todavia, o que era um computador. Um “brinquedo”? Uma emancipação do brinquedo põe-se a caminho; quanto mais a
industrialização avança, tanto mais decididamente o brinquedo se subtrai ao
controle da família, tornando-se cada vez mais estranho não só às crianças, mas
também aos pais.''(BENJAMIN, 2002, p. 91-92). Às vezes, computa a dor de toda miséria humana. O inventor do
experimento, Dr. Mitra, constata neste menino, “o primeiro homem, uma criança não mais que
oito anos, olhar triste, perdido, “a dar um salto que podemos descrever dois ou
três mil anos de história, em alguns minutos.”.
Observando seu comportamento, apesar de ainda
carregado de seriedade para pouca idade foi visível, o aumento de sua autoconfiança,
“se afirmou depois que ele apreendeu sozinho a usar um computador”. A
professora confessa que ele estava tornando-se bastante confiante e expressivo,
também. Ao responder no vídeo qual era a sua definição de internet, pondera, “é
aquilo com que você pode fazer qualquer coisa.”.
A causa efeito surtiu resultado e o experimento,
controlado aos cuidados do Dr. Mitra, é replicado em muitos outros lugares com
resultados semelhantes. Quer dizer, em algumas horas e sem qualquer instrução
as crianças começavam a navegar pela internet. Nesta sociedade indiana, em que,
apenas uma a cada três mulheres sabe ler, este experimento foi um meio para as
garotas superarem barreiras. ''Os jogos infantis são
impregnados de comportamentos miméticos, que não se limitam de modo algum à
imitação de pessoas. A criança não brinca apenas de ser comerciante ou
professor, mas também moinho de vento e trem. A questão importante, contudo, é
saber qual a utilidade para a criança desse adestramento da atitude mimética. ''(BENJAMIN,
1986, p.108) Inclusive, inventaram novos termos de identificação
com a cultura, como por exemplo, o “cursor” passou a chamar-se “sui”, que
significa “ponteiro de relógio” e a ampulheta, “damru”, que é o tambor
carregado na mão da Deusa Shiva. Perguntado a um grupo de meninas o que era na
opinião delas a internet, respondem, que “é usada para enviar mensagens e
cartas”, fascinadas, riam, entusiasmadas, alegres pela nova oportunidade de
integração apresentada, até aquele momento.
Como grifou o
criador do experimento, este “buraco é um método para criar uma porta.”. A
pergunta é para onde? Com que intenção? Incluir aquelas crianças carentes de
tudo e expô-las aos “leões” inventores dos “brinquedinhos plastificados
asiáticos”, somando mais seres consumidores do massificado? Sim, é uma fenda,
um buraco aberto, naquele muro que separa dois mundos num mesmo mundo,
igualmente, no caosmico todos almejam uma fenda, nesga de luz, uma que seja
para respirar do progresso desenfreado, a “modernidade organizada nas cidades”,
quem não quer livrar-se dos entraves, do tudo que limita na sociedade moderna:
o ver onde não tem nada, somente a natureza alimentando a alma. A correria
alucinada impede, trava, aliena, como uma ruína decadente e desprovida de
memória, empurrando para morte aquele ser, manipula, acumula hora, gasta o
tempo, desperdiça, boicota, cansa, desmancha, arrocha, bestializa, atropela.
Mas, confrontar e questionar a validade desta ação, o quanto isto será válido
para estas crianças levando-as à inclusão, formação e educação. Uma sociedade
em ruínas e a constante busca da eficiência infinita. O quanto a tecnologia
ajudaria na transformação daquela realidade ou estaria, na era da
reprodutibilidade, aumentando os “ratos” deste imenso laboratório? O interesse
dessa “poderosa empresa” não seria “adestrar”, “aproximar” estas crianças “dos
vizinhos de muro”, que afinal querem lhes dar “educação” e num futuro próximo
poderão, até trabalhar, produzir e aplicar todos os ensinamentos rapidamente
apreendidos somente com um clique. Apreendem como é o “mundo” do “bandido e do
mocinho”, como devem atuar na sociedade do espetáculo e jogar o jogo das aparências,
inserindo-se, clicando, um aperto de mão aqui e ali, para sua “inclusão” e
obter o máximo de aplausos, rumo ao “sucesso”.
Uma nova forma de
miséria surgiu com esse monstruoso desenvolvimento da técnica, sobrepondo-se ao
homem. A angustiante riqueza de ideias que se difundiu entre, ou melhor, sobre
as pessoas, com a renovação da astrologia e da ioga, da Christian Science e da
quiromancia, do vegetarianismo e da gnose, da escolástica e do espiritualismo,
é o reverso dessa miséria. Porque não é uma renovação autêntica que está em
jogo, e sim uma galvanização. Pensemos nos esplêndidos quadros de Ensor, nos
quais uma grande fantasmagoria enche as ruas das metrópoles: pequeno-burgueses
com fantasias carnavalescas, máscaras disformes brancas de farinha, coroas de
folha de estanho, rodopiam imprevisivelmente ao longo das ruas. Esses quadros
são talvez a cópia da Renascença terrível e caótica na qual tantos depositam
suas esperanças. Aqui se revela, com toda certeza, que nossa pobreza que
recebeu novamente um rosto nítido e preciso como o do mendigo medieval. Pois,
qual o valor de todo nosso patrimônio cultural, se a experiência não mais
vincula a nós? A horrível mixórdia de estilos e concepções do mundo do século
passado mostrou-nos com tanta clareza aonde esses valores culturais podem nos
conduzir, quando a experiência nos é subtraída, hipócrita ou sorrateiramente,
que é hoje em dia uma prova de honradez confessar nossa pobreza. Sim, é
preferível confessar que essa pobreza de experiência não é mais privada, mas de
toda a humanidade. Surge assim uma nova barbárie.
(Benjamin, Walter. P. 115)
Uma verdadeira guerra para comer, ganhar, adicionar,
acumular bens de consumo. Nesta busca da eficiência infinita, em cumprir as
leis do “mercado” e manter a “máquina funcionando”, este ser humano arruinado
pelas exigências cotidianas pode quem sabe desviar? Se distrair? Pegar outro
caminho? Mergulhar no inusitado? Perder o chão? Neste limiar entre o concreto
cinza e a natureza, a arte, a literatura e a poesia, existiria uma
descontinuidade no seu dia a dia?
Pobreza de
experiência: não se deve imaginar que os homens aspirem a novas experiências.
Não, eles aspiram a um mundo em que possam ostentar tão pura e tão claramente
sua pobreza externa e interna, que algo de decente possa resultar disso. Nem
sempre eles são ignorantes ou inexperientes. Muitas vezes, podemos afirmar o oposto:
eles “devoram” tudo, a “cultura” e os “homens”, e ficaram saciados e exaustos.
“““ “Vocês” estão tão cansados- e tudo porque não concentram todos os
pensamentos num plano totalmente simples ma absolutamente grandioso.” Ao
cansaço segue-se o sonho, e não é raro, que o sonho compense a tristeza e o
desânimo do dia, realizando a existência inteiramente simples e absolutamente
grandiosa que não pode ser realizada durante o dia, por falta de forças. A
existência do camundongo Mickey é um desses sonhos do homem contemporâneo. É
uma existência cheia de milagres, que não somente superam os milagres técnicos
como zombam deles. Pois, o mais extraordinário neles é que todos, sem qualquer
improvisadamente, saem do corpo do camundongo Mickey, dos seus aliados e
perseguidores, dos móveis mais cotidianos, das árvores, nuvens e lagos. A
natureza e a técnica, o primitivismo e o conforto se unificam completamente, e
aos olhos das pessoas, fatigadas com as complicações infinitas da vida diária e
que veem o objetivo da vida apenas como o mais remoto ponto de fuga numa
interminável perspectiva de meios, surge um existência que se basta a si mesma,
em cada episódio, o modo mais simples e mais cômodo, e na qual um automóvel não
pesa mais que um chapéu de palha, e uma fruta na árvore se arredonda como a
gôndola de um balão.
Podemos agora tomar distância
para avaliar o conjunto. Ficamos pobres. Abandonamos uma depois da outra todas
as peças do patrimônio humano, tivemos que empenhá-las muitas vezes a um
centésimo do seu valor para recebermos em troca a moeda “miúda” do “atual”. A
crise econômica está diante da porta, atrás dela está uma sombra, a próxima
guerra. A tenacidade é hoje privilégio de um pequeno grupo dos poderosos, que
sabe Deus não são mais humanos que outros; na maioria bárbaros, mas no bom
sentido. Porém os outros precisam instalar-se, de novo e co poucos meios. São
solidários dos homens que fizeram do novo uma coisa essencialmente sua, com
lucidez e capacidade de renúncia. Em seus edifícios, quadros e narrativas a
humanidade se prepara, se necessário, para sobreviver à cultura. E o que é mais
importante: ela o faz rindo. Talvez esse riso tenha aqui e ali um som bárbaro.
Perfeito. No meio tempo, possa o individuo dar um pouco de humanidade àquela
massa, que um dia talvez retribua com juros e com os juros dos juros.
(Benjamin, Walter. P.118,119)
Teria um furo a ser penetrado, que recuperasse
a pulsão, o viço, a robustez, a tez de um rosto pálido e cansado e entrar,
perfurar a “ruína eficiente” e espiar, através de um muro imaginário o “al di
là” de Platão. Finalmente, enxergar a luz do conhecimento na caverna em que se
encontra. Espiar feito um “Vouyer” o caminho da liberdade. Será que a
contemporaneidade está na descontinuidade de seu tempo?
Equacionar os resultados no uso da técnica e deixar de
lado o passo a passo de uma evolução construída num arquivo repleto de memória,
vivida na cultura, nas lendas, nos ritos, na história daquela comunidade. As
celebrações, festas, brincadeiras juvenis fazem parte deste corpo volumoso, que
resultará no “Eu” banido de um viver poético, que reconhece sua “pequenez”
diante do infinito.
Em O narrador, Benjamin escreve:
''Contar histórias sempre foi a arte de contá-las de novo, e ela se perde
quando as histórias não são mais conservadas. Ela se perde porque ninguém mais
fia ou tece enquanto ouve a história. Quanto mais o ouvinte se esquece de si
mesmo, mais profundamente se grava nele o que é ouvido. Quando o ritmo do
trabalho se apodera dele, ele escuta as histórias de tal maneira que adquire
espontaneamente o dom de narrá-las. Assim se teceu a rede em que está guardado
o dom narrativo. E assim essa rede se desfaz hoje por todos os lados, depois de
ter sido tecida, há milênios, em torno das mais antigas formas de trabalho manual.
'' (p.205)
Nesse processo societário de superficialidade, dando
ênfase somente ao técnico e especialista, perdeu-se o homem poliédrico. Dando
espaço à fácil manipulação, ao controle, falta de opinião crítica ou uma
ideologia humanitária. O ensinar do “humus”, o cavar a terra, o sujar-se no
barro, o entrar mais fundo em si, a verdadeira pesquisa humanística, a da
formação, transforma-se em “ganhar informação”, acumular no cérebro o máximo de
”mandamentos” e pré- conceitos.
A experiência
transmitida pelo relato deve ser comum ao narrador e ao ouvinte. Pressupõe,
portanto, uma comunidade de vida e de discurso que o rápido desenvolvimento do
capitalismo, da técnica, sobretudo, destruiu. A distância entre os grupos
humanos, particularmente entre as gerações, transformou-se hoje em abismo
porque as condições de vida mudam em um ritmo demasiado rápido para a
capacidade humana de assimilação. Enquanto no passado o ancião que se
aproximava da morte era o depositário privilegiado de uma experiência que
transmitia aos mais jovens, hoje ele não passa de um velho cujo discurso é
inútil.
(Benjamin, Walter. P. 10)
Um esvaziamento do ser por falta da pesquisa, ensinar
e apreender a busca por si esbarra no amontoado de informação a conquistar.
Detentor, deste poder informativo, mas carente de conhecimento em si próprio e
do meio que o cerca, longe de fazer o que gosta, pois a pessoa nunca será a sua
profissão e sua vida não resumi-se ao “mercado de trabalho”, vivencia uma
verdadeira guerra e verbaliza a cultura do “belíssimo”: toma este remédio que é
tiro e queda, vai tirar o pai da forca, atirei o pau no gato. O
Palavras carregadas de pré-conceitos e ideologias da
guerra. Tudo que motiva a sociedade é a batalha. Elogiar alguém, pessoa
guerreira, pessoa lutadora. Os filmes de maior audiência são os bélicos,
explosões, catástrofe, sangue e morte. Aliás, a pessoa deve ser guerreira e
estar preparada para morte e isto afasta a possibilidade de criar empatia, o vínculo,
a conexão com o próximo. Pai e filho não criam empatia, vínculo de afeto e a
consequência é o desvio, o desligamento dos fios com a consciência infinita.
A
referência ao que falta, ou a um passado que confronte o sujeito com a dimensão
da falta se apaga, hoje. O ''moderno'' é não ter a história como referência,
prescindir do outro, ser autônomo, artificializado em meio a um emaranhado sem
fim de objetos sem nenhuma utilidade a não ser a de sustentar a ilusão de uma
completude impossível. Benjamin, a este respeito, escreve: ''A cega vontade de
salvar o prestígio da existência pessoal, de preferência a destacá-la, pelo
menos, através da soberana avaliação de sua impotência e de seu embaraço, do
pano de fundo do enceguecimento geral, impõe-se quase por toda parte. ''
(BENJAMIN, 1993, p.24)
A arte propícia uma saída para o infinito, assim como,
as suas poéticas e um viver mais poético. Encontrar poesia em um objeto, numa
ação, num ato e dar vazão ao imenso, um rasgar, desdobrar, alcançar outros
mundos e sair do limite uterino, da casa, família, da igreja, do templo, da
escola, do carro, quadrados de uma imagem fotografada na era da
reprodutibilidade técnica.
É indispensável
levar em conta essas relações em um estudo que se propõe estudar a arte na era
de sua reprodutibilidade técnica. Porque elas preparam o caminho para a
descoberta decisiva: com a reprodutibilidade técnica, a obra de arte se
emancipa parasitária, destacando-se do ritual. A obra de arte reproduzida é
cada vez mais a reprodução de uma obra de arte criada para ser reproduzida. A
chapa fotográfica, por exemplo, permite uma grande variedade de cópias: a
questão da autenticidade das cópias não tem nenhum sentido. Mas, no momento em
que o critério da autenticidade deixa de aplicar-se à produção artística, toda
a função social da arte se transforma. Em vez de fundar-se no ritual, ela passa
a fundar-se em outra práxis: a política.
(Benjamin, Walter. P. 171)
A ruína deste, fazer mecânico e diário, acaba por
empurrar este sujeito cansado, a outro caminho, inesperado, ao silêncio,
desacelera e ameniza os sons da metrópole polifônica, faz mudar o olhar,
alcançar novas esferas do conhecimento. Buracos, fendas, frestas que aguçam a
curiosidade, invertem a ordem materialista.
Se essa leitura a
partir dos astros, das vísceras e dos acasos era para o primitivo sinônimo de
leitura em geral, e se, além disso, existiram elos mediadores para uma nova
leitura, como foi o caso das runas, pode-se supor que o dom mimético, outrora o
fundamento da clarividência, migrou gradativamente, no decorrer dos milênios,
para a linguagem e para a escrita, nelas produzindo um arquivo completo de
semelhança extrassensíveis. Nessa perspectiva, a linguagem seria a mais alta
aplicação da faculdade mimética: um médium em que as faculdades primitivas de
percepção do semelhante penetraram tão completamente, que ela se converteu no
médium em que as coisas se encontram e se relacionam, não diretamente como
antes, no espírito do vidente ou do sacerdote, mas em suas essências, nas
substâncias mais fugazes e delicadas, nos próprios aromas. Em ouras palavras: a
clarividência confiou à escrita e à linguagem as suas antigas forças, no correr
da história.
Porém o ritmo, a
velocidade na leitura e na escrita, inseparáveis desse processo, seriam o
esforço, ou o dom, de fazer o espírito participar daquele segmento temporal no
qual a s semelhanças irrompem do fluxo das coisas, transitoriamente, para
desaparecerem em seguida. Assim, mesmo a leitura profana, para ser
compreensível, partilha com a leitura mágica a característica de ter que
submeter-se a um tempo necessário, ou antes, a um momento crítico que o leitor
por nenhum preço pode esquecer se não quiser sair de mãos vazias.
(Benjamin, Walter. P.112, 113)
Retomar o fio da meada para lançar-se ao infinito sem
estar preso a nada ou deixar-se emaranhar nas artimanhas e engendramentos de um
sistema organizado para engessar e passar seu “tempo” a empreender, produzir,
ganhar, fabricar, mostrar potencialidades, eficiência levada às últimas
consequências.
No inicio, essa
possibilidade limitou-se à publicação de sua correspondência na seção “cartas
dos leitores”. Hoje em dia, raros são os europeus inseridos no processo de
trabalho que em princípio não tenham uma ocasião qualquer para publicar um
episódio da sua vida profissional, uma reclamação ou uma reportagem Com isso a
diferença essencial entre o autor e público está a ponto de desaparecer. Ela se
transforma numa diferença funcional e contingente. A cada instante, o leitor
está pronto a converter-se num escritor. Num processo de trabalho cada vez mais
especializado, cada individuo se torna bem ou mal um perito em algum setor,
mesmo que seja num pequeno comércio, e como tal pode ter acesso à condição de
autor. O mundo do trabalho toma a palavra. Saber escrever sobre o trabalho
passa a fazer parte das habilidades necessárias para executá-lo. A competência
literária passa a fundar-se na formação politécnica, e não na educação especializada,
convertendo-se, assim em coisa de todos.
(Benjamin, Walter. P. 184)
Viajar no fio da incerteza sabendo que o único
companheiro será este fio ligando ao universo “caosmico”, abrindo-se a mundos
de infinitas conexões e possibilidades.
Este imenso, ao qual o filósofo Giordano Bruno, ainda
que passados séculos de distância, denominou, vislumbrou e adentrou, deixando
para trás os atônitos. Porque acreditou no etéreo espaço e sua infinitude. Ao
escrever o poema De Imenso, O Imenso, arou, arranhou, perfurou sem
pré-conceitos outras esferas jamais tocadas ou visitadas, os além-mundos,
mundos dentro de outros mundos, nada fixos, em constante mudança e
transformação, contrária a teoria de finitude da época das teorias fixas aristotélicas.
Così io sorgo
impavido a solcare con le ali l'immensità dello spazio,
senza che il
pregiudizio mi faccia arrestare contro le sfere celesti,
la cui esistenza
fu erroneamente dedotta da un falso principio.
Mentre mi sollevo da questo mondo verso altri lucenti
Mentre mi sollevo da questo mondo verso altri lucenti
E percorro da
ogni parte l'etereo spazio, lascio dietro le spalle,
lontano, lo stupore degli attoniti.
Assim, eu planta
herbácea corajosa ao arar com asas a imensidade do espaço
Sem que o pré-conceito
me faça interromper
Ou bloquear o
desenvolvimento contra as esferas celestes,
Cuja existência
foi erroneamente deduzida de um falso princípio.
Enquanto me
levanto deste mundo em direção ao outro brilhante
E percorro cada
parte o etéreo espaço, deixo atrás de mim, o assombro dos atônitos.
Em
particular, sobre a natureza argumenta acerca do infinito, universos e mundos,
Bruno expõe o quanto abre os sentidos, contenta o espírito, magnífica o
intelecto e reduz o homem a verdadeira “beatitudine” que pode ter como homem e
consistente nesta composição, porque o libera fervorosamente ao prazer e cego
ao sentimento de dores, o faz aproveitar de estar presente e não temer o que
esperar no futuro.
Ao final, se existe uma porta que atravessa os muros,
transpõe para um novo tempo seria o tempo da descontinuidade, de um buraco
aberto e sem fim, da incerteza, do caótico, do invisível, do inexplicável, um
mistério feito com conexões menos elétricas e mais genéticas. Como Giordano
Bruno destaca em Vínculos, Artigo VIII.
O homem
que é mais verdadeiramente homem quando se vê ligado, sobretudo pela espécie
das coisas mais dignas. E a este agrada muito mais esperar por essas coisas
mais dignas do que possuir as vis. Na verdade, a posse destas facilmente nos
provoca a náusea; mas morremos de amor mais ardentemente por aquelas que não possuímos
mais facilmente.
REFERÊNCIA
BIBLIOGRÁFICA
BENJAMIN, Walter. Reflexões
sobre o brinquedo, a criança e a educação, SP, Ed. 34,
2002. .
BENJAMIN, Walter. Rua de mão
única, Obras escolhidas II, SP, Ed. Brasiliense, 1993. .
BENJAMIN, Walter. Magia e
técnica, arte e política, Obras escolhidas I, SP, Ed. Brasiliense, 1986.
Bruno, Giordano. A cerca do infinito,
universos e mundos.
Bruno,
Giordano. Os Vínculos. De Vinculis in genere, Fundação Bienal/ Hedra, SP, 2012. .
O Derradeiro em Mario (s) de Andrade
* Flavia
Wasserman
Resumo: Usar o termo derradeiro neste artigo, para
falar de Mário de Andrade e sua efetiva participação no cenário do modernismo.
Na Semana de arte Moderna é a última opção entre tantos brasileiros
consagrados. Aquele que não é seguido por nenhum outro do seu gênero ou
espécie. No último instante ou em dado período estava lá, pronto, sempre atento
às mudanças, estudioso, múltiplo. Quis entender não somente seu País, sua
gente, seu povo, as entranhas da brasiliadade, assim como, as teorias do "
derradeiro destino do universo", na cosmologia do infinito flexível e
comungou de obras introdutóorias da
modernidade e que ecoam no cosmos, até hoje: Freud, Nicolao Máquiável, Galileo,
Giordano Bruno, Ariosto, Tasso. Concedendo a possuir um vasto arquivo rumo ao
certeiro golpe derradeiro na criação de sua obra prima, Macunaíma.
Palavras chaves: derradeiro, modernidade, arquivo,
brasilidade, Mário de Andrade, múltiplo, Macunaíma, Cosmos, infinito, universo.
Abstract:: Use the term in this last article, to
talk Mário de Andrade and their effective participation in the setting of
modernism. Week of Modern Art is the last option among many Brazilians
enshrined. One that is not followed by any other of its genus or species. At
the last moment or in a given period was there, ready, always alert to changes,
scholar, multiple. Wanted to understand not only your country, your people,
your people, the bowels of brasiliadade, as well as theories of the
"ultimate fate of the universe", in the cosmology of infinite
flexible and communed of introdutóorias works of modernity and that echo in the
cosmos, until today: Freud, Nicolao Machiavelli, Galileo, Giordano Bruno,
Ariosto, Tasso. Giving possess a vast archive into the deadly blow ultimate in
creating your masterpiece, Macunaíma.
Words-Key: Last, modernity, file, Brazilianness,
Mário de Andrade, multiple Macunaíma, Cosmos, infinite universe.
* mestranda da PPGL Programa de Pós Graduação em Literatura
na Universidade Federal de Santa Catarina UFSC.
Fadado pelas rupturas, o que estava por terminar,
assim seguia andarilho na trilha de sons, imagens, gestos, histórias, rumores,
no rastro do seu instinto inscrito na sua verdade poética. Andrades, existiram muitos, mesmo em sua época, Carlos,
Drumond, Oswald, mas Mário somente um, o qual foi eleito desde o principio para
marcar época.
O artigo de Oswald de
Andrade pôs na berlinda o poeta de Paulicéia Desvairada. Se lhe causou
dissabores, confessados, aliás, pelo escritor em diferentes oportunidades,
prestou-lhe, no entanto, o grande benefício de violentar-lhe a timidez,
forçando-o a aceitar o posto no comando da rebelião modernista. Mário de
Andrade, aceito pelos companheiros como a principal figura do grupo, após o
escândalo que o envolveu, estava, daí por diante, comprometido com o movimento
reformista. Mais culto, melhor informado, leitor dos italianos e franceses
modernos, admirador deles, discutidor atilado de teorias e estéticas, conhecedor
estudioso das letras nacionais, o seu destino era a liderança e para ela foi
arrastado. (Brito, Mario da Silva. Pg 253)
Acompanhado por suas várias facetas, a curiosidade
levou Mário de Andrade longe, no caminho do desconhecido deparando-se com o
múltiplo dele mesmo. Esmiuçando o “Eu” tornando-se único em vários.
O rasgar da sua escrita anuncia o final, mesmo em
tom maior, quando lírico, gritava um murmúrio derradeiro, talvez a urgência
transformadora em algo farejado no real. A necessidade identitária batucou
forte nas letras andrandianas, a ponto de se fazer ouvir no mais improvável
personagem.
No balanço das
atividades modernistas de 1921, cabe lugar à parte e destacado, a Mário de
Andrade. Inicialmente pela sua revelação, nesse ano, como poeta futurista, isto
é, como autor de versos de total ineditismo em toda a história literária até
então registrada, e que por seu ineditismo lhe valeu a categoria de futurista
e, depois, por sua interferência na polêmica que visava a derrubar os
postulados e gostos vigentes. (Brito, Mário da Silva. Pg 253)
Usou e entrou de cabeça no emaranhado chamado
alma. Ousou a palavra inconsciente partindo o inteiro, o completo, tornando
este evento freudiano sua meta na trajetória pintada de vermelho, onde o rubor
em sinal de alerta faz nascer um humano complexo. Como nos diz Antonio Candido,
os nossos modernistas se informaram pois rapidamente da arte européia
devanguarda, aprenderam a psicanálise e plasmaram um tipo ao mesmo tempo local
e universal de expressão, reencontrando a influência européia por um
mergulho no detalhe brasileiro.Foi Mário de
Andrade, dentre os modernistas, quem se mostrou o mais aplicado leitor de
Freud, estudando os seus conceitos nas obras que possuía em francês, muitas
vezes assinaladas, sublinhadas ou comentadas,deixando-nos as marcas da sua
dedicada leitura.
Partido
pelas angustias da vida moderna deixa para trás o linear. Apesar, das
insistências mundanas de outrem em organizar o caótico na metrópole, ignora
estes preceitos com ares baudelerianos. Instiga, questiona e não aceita
mastigar restos antropofágicos de uma cultura devoradora alheia á sua.
Para que isso pudesse realizar-se, contudo, a intelectualidade
brasileira precisaria empreender efetivamente uma ruptura significativa com a
tradição européia, na qual estaria permanentemente se espelhando. Ou seja, o
intelectual brasileiro estaria sempre escrevendo com o olhar voltado para a
Europa e esquecia assim o que estaria ocorrendo no Brasil. (Andrade, 2002a)
Lança mão, usando todos elementos disponíveis. À
ferro, fogo e sangue mergulha em águas, atravessa rios e encharca linhas com
anotações vinda aos borbotões como lágrimas rolando, não poupa esforços e
espreme à última gota no nascimento rapsódico, prosaico, poético, fotográfico,
em cada obra, ali estendida, inacabada à espreita da espera de uma próxima
letra, sílaba, que dará vida à palavra, frase, texto num pretexto incontrolável
em expressar algo de um mundo qualquer aos pedaços. Há uma gota de sangue em
cada poema, seu primeiro poema, apesar dos resquícios de um parnasianismo
anuncia a que vinha.
Assim como há resquício de barro
Nas estradas asfaltadas
E ruínas pelo impacto das guerras
e catástrofes
Há em cada poema uma lágrima;
Nas estradas asfaltadas
E ruínas pelo impacto das guerras
e catástrofes
Há em cada poema uma lágrima;
Assim como ecoa aplausos e vaias
Da grande semana! Onde sobra
Pedaços mastigados na antropofagia
Mário não desperdiçaria uma idéia
Sem que esfacelasse fontes, rituais e oferendas.
Da grande semana! Onde sobra
Pedaços mastigados na antropofagia
Mário não desperdiçaria uma idéia
Sem que esfacelasse fontes, rituais e oferendas.
Há uma gota de suor em cada letra
E em cada verso um gozo de dor
Por que sempre a dor do poeta?
Simples… É exatamente aí que sucumbi
As mágoas de exprimir pelo dom;
E despedir a força vital paulatinamente…
E em cada verso um gozo de dor
Por que sempre a dor do poeta?
Simples… É exatamente aí que sucumbi
As mágoas de exprimir pelo dom;
E despedir a força vital paulatinamente…
Mas há de deixar cada poeta, em cada página seca
A ata boêmia, idéia difusa e
sua vida latente!
A ata boêmia, idéia difusa e
sua vida latente!
Incansável,
os anos foram passando e a última estrofe não chegava nunca, vinham outras e
mais outras. Desorganiza gavetas, desarruma o funcional na burocracia diária.
Segue servindo o social. Arruma o tempo numa mágica extraordinária no ordinário
cotidiano e faz brotar contos, cartas, romances, poemas, artigos e criticas
oriundas, daquele multifacetado, por vezes estropiado, porém apruma-se sem deixar-se envolver pelas mazelas das
instituições. Cultiva, guarda e estimula raízes não deixando-se
contaminar.
Quando falei que houve
um sacrifício de mim, e há, no que faço, creio que não me referi ao sacrifício
da linguagem (... ) o sacrifício penoso é o das minhas liberdades morais
cerceadas. O mais penoso ainda é o das minhas verdades intelectuais,
independentes até de mim, e por mim mesmo rejeitadas no que escrevo e ajo, em
proveito da normalização, da fixação, da permanência de outras verdades
humanas, sociais que eu friamente sei que são mais importantes. (Andrade,
p.235)
Num adeus às formas, delimitadas por um passado
mimético platônico, o parnaso limítrofe esvaía pedindo passagem ao poetar livre
somado às contingências da comunidade abre uma vala ao pesquisador das suas
origens. Estaria sofrendo do que Derrida chama de uma febre de Arquivo? É arder de paixão, segundo o filósofo. É procurar
incessantemente o arquivo onde ele se esconde. É dirigir-se a ele com um desejo
compulsivo, repetitivo, um desejo irreprimível de retorno à origem, uma dor da
pátria, uma saudade de casa. “Impaciência absoluta de um desejo de memória”, o
mal de arquivo é, portanto, uma paixão do arquivo. Cria com isto um
ambiente pleno de brasilidade, a “stimmung” splitzeriana, a harmonia, a
atmosfera, em linguajar eco-brasileiro, um micro clima capaz de celebrar seus
ritos, mitos e porque não dizer conflitos peculiares de um povo carente em
reconhecer sua língua, tradição, costumes, mitologias, seus heróis e hinos
mantidos ao longo do tempo em velado
cativeiro.Nada é menos garantido hoje, diz Derrida,
que a palavra arquivo, e nada é mais perturbador: a perturbação do arquivo é “a
perturbação dos segredos, dos complôs, da clandestinidade, das conjurações meio
públicas, meio privadas, entre a família, a sociedade e o Estado”. Perturbação
é aquilo que turva a visão, que impede de ver e saber. A perturbação do arquivo
deriva do mal de arquivo.
Ao mesmo passo, uma espécie de renascimento tardio
em terra Brasis vislumbra um expansionismo em todas as áreas. Observar o quanto
aqueles séculos, XVI e XVII foram o prenuncio do modernismo, embora
talvez fosse inconsciente estava latente e assimilado. Que nação não bebeu
nesta fonte?
Francesco De
Sanctis, diz ser um mal entendido que a razão não podia contradizer a fé, nesta
época. A arte era a contemplação de uma
forma perfeita na indiferença e contemplação do conteúdo.. A sociedade vagava
na arte dela mesma.. Uma sociedade sem pensamentos e acadêmica e não tinha,
ainda olhado dentro de si para fazer um exame de consciência. Quem somos? De
onde venho? Para onde vou? Somos corpo: viemos da terra e tornaremos à terra.A
burguesia não queria ser perturbada em seu alto sono. O materialismo estava em
tudo: vida, letras, moral, política, , no homem e na natureza. Evitava-se a
palavra materialismo e sim cultura, arte, erudição, civilidade, beleza,
elegância, hipocresia e curta inteligência. Lutero proclamou a reforma da
igreja, mas ficou estranho àquela cultura italiana que se desenvolvia com seus
próprios meios.
Maquiável, neste instante, é a consciência e o
pensamento do século. O materialismo dissimulado como doutrina em meio ao fato
e presente em todas as implicações da vida. A reforma luterana só poderia ficar
estranha à cultura italiana e o seu Lutero foi Nicolao Maquiável. Passa a ser a
consciência e o pensamento do século XVI, a sociedade que olha para si,
interroga-se e se conhece, a negação da Idade Média somada à afirmação mais
clara dos novos tempos. O materialismo dissmulado como doutrina, em meio ao
fato de estar presente em todas as questões da vida. Uma civilização contra o
misticismo e exagerado espiritualismo religioso. Uma tendência a considerar o homem
e a natureza e m si mesmos. Um naturalismo ajudado e potencializado com ajuda
dos clássicos e pelo progresso da inteligência e da cultura. Com certeza, o
conceito de Maquiável. Considerar as coisas na sua verdade e como isto faz
parte da observação do intecto. Justo, de onde nasce a ciência moderna.
Isto é, Maquiável demonstra as evidências no livro,
O Principe: o discurso, história de Florença e os diálogos sobre as milícias.
Disto tudo, nasce a ciência do homem, não somente como individuo, mas um ser
coletivo, classe, povo, sociedade e humanidade. A comédia humana se apresenta
na terra: chama-se história, filosofia, política, a nova ciência. A ciência da
natureza vêm em seguida. Não acreditava-se em milagre ou astrologia
O conceito de Maquiável aplicado à natureza
aparecerá com Galileo, Giordano Bruno e a corte dos naturalistas.. Explica De
Sanctis, “o que é vivo na literatura está vivo na consciência”. Por isto,
Maquiável cria o modelo ideal da prosa. Na contramão da sorte ou providência.
De fato, um novo conceito maquiaveliano: o mundo é tal qual fazemos nós e isto
deve profundamente transformar a arte.
Com seu bíblico tratado político, O Príncipe, torna-se um dos livros mais
traduzidos e lidos no mundo ocidental, consagrando o italiano Maquiável. Assim
como, o poeta Ariosto com seu famoso Orlando O furioso, Tasso e sua Jerusalém
Liberta. Em Ludovico Ariosto a poesia é vista como espaço privilegiado do
diálogo entre a razão e a loucura, explica o tradutor Pedro Garcez Guirardi, em
nota. Continua Garcez, se, contra a s teorizações abstratas, Maquiável defende
a autonomia do pensar político, também Ariosto diante da emergência das
teorizações retóricas, defende a autonomia da criação artística. Daí a
importância que atinge, no Orlando Furioso, o trabalho artesanal do poeta, pois
é dele que dependerá a criação do mundo, onde ambas as interlocutoras possam
reconhecer-se. De um mundo que tenha a beleza ponderada pelo sentido, mas
também a beleza imponderável da loucura.
Isto que levou Ariosto a ser artista como poucos, e
a entusiasmar outros artistas. De todos estes admiradores de Ariosto, o mais
conhecido é talvez Cervantes. Deixando de lado as diversas referências a Dom
Quixote ao Orlando Furioso, recordemos somente o trecho, em que diz que o poema
de Ariosto em italiano merecia ser erguido sobre a cabeça, como se faz com a liturgia nas sagradas
escrituras. Outro admirador excepcional da arte de Ariosto foi Voltaire. Entre
nós, Manuel Bandeira conta a Mario de Andrade ter relido “com delícia o Ariosto
e o Tasso”. E continua: “Por alguns dias vivi encantado com estes versos do
Orlando” e passa a citar em italiano o fecho da VIII em que se descreve a
fraude. Por acrescentar à voz de grandes escritores, a de um notável crítico
atual, citemos o já lembrado Erich Auerbach, para quem Ariosto é “um dos poetas
mais puramente artistas de todos os tempos”, todo o espírito da renascença,
acrescenta Auerbach, está em seu poema, “cuja leitura é um dos prazeres mais
perfeitos que a literatura europeia nos oferece”.
Segue com o discurso, o tradutor de Ariosto, Pedro
Garcez e sublinha outra semelhante admiração, a qual expressa Fidelino de
Figueiredo. Embora julgando faltar a Ariosto (como também a Tasso) a presença
da coletividade nacional, inspiradora de Camões, mas reconhece o grande
crítico” a maestria da expressão literáriados dois poetas que levaram a
virtuosidade verbal a alturas desconhecidas, só comparáveis aos novos
descobrimentos nas artes plásticas de Rafael, Vinci e Cellini.
No Orlando Furioso, tal como o lemos hoje, o léxico
de inspiração petrarquista se harmoniza com a leveza do falar cotidiano. Nisto
está muito a elegância de Ariosto, que consegue ser, ao mesmo tempo,
refinadissimo e próximo do coloquial. Sua linguagem é de clareza cristalina,
por ser sóbria em inversões e jamais rebuscada.
Foi assim, que o poema encantou aristocratas
refinados das cortes renascentistas e gênios do porte de Cervantes e se tornou
querido daqueles que mal sabiam ler. Finaliza este raciocínio ao citar o
francês Montaigne, que observa as pastoras dos campos, onde percorria, tinham
sempre “l´Ariosto in bocca” e acrescenta o pensador, as personagens “sensatas”
de Ariosto pelos padrões medievais e “desvairadas”pelos padrões renascentista,
tornam-se figuras de perene transformação da sensatez em loucura: o sensato de
ontem é o louco de hoje, mas o louco de hoje, será talvez o sensato de amanhã.
Libertar da leitura tradicional as imagens de damas e cavaleiros, deixá-las
entregues à sua própria loucura, tornando-as expressão da condição humana, esta
foi a genial contribuição da fantasia de Ariosto.
A prosa, desenvolveu-se a partir destes nomes na
literatura italiana, acompanhada das
descobertas na ciência, o homem passa a ser o centro, a cosmologia de
Galileu e o filósofo Giordano Bruno,
avançam em contraposição ao fixo, ao finito aristotélico. Ou seja, aumenta o
interesse pelos mistérios da natureza e deste novo homem com o desenvolvimenito
da filosofia na forma de diálogos. Desde então, a conversa do literário contém
“ o derradeiro destino do universo”, termo usado pela cosmologia física, que
desencadeia a principal questão da mítica hamletiana reformulada: o que somos,
para onde vamos e até quando? “Nessa perspectiva
Maquiavel não foi apenas o fundador do moderno discurso sobre a política, como
nos ensina a história da filosofia política (Berns, 2000; Lefort, 1972;
Skinner, 1981; Voegelin, 2000), mas também do discurso moderno da história, já
que as escolhas e ações do príncipe forjariam a própria historicidade dos
acontecimentos na ordem da experiência temporal. Os discursos da política e da
história passaram a conjugar-se de maneira orgânica desde então, pois seria a
nova ordem da imprevisibilidade dos acontecimentos, num 'universo' que começara
a se delinear como infinito, que provocaria ruptura e desconti-nuidade com a
concepção do 'cosmo' finito e circular da Antiguidade e da Idade Média (Koyré,
1973), que começara então lentamente a caducar.” (Birman, Joel) Imbuído
deste espírito, apesar da convivência em
ambiente burocrático, ou até porque encontrava-se nesta condição, o funcionário
público Mario de Andrade experimenta na pele e
“in loco” as artimanhas do poder, igualmente ao escritor
“cinquecentesco”, Nicolao Maquiável.
Já consagrado, o autor da Paulicéia Desvairada, quatro
séculos mais tarde, vislumbra ainda mais, em profundidade, simetria e
perspectiva. Enxerga luz renascentista. Em “Lundu do escritor difícil” indica a
pré-disposição.
Eu sou um escritor difícil
Que a muita gente enquizila,
Porém essa culpa é fácil
De se acabar duma vez:
É só tirar a cortina
Que entra luz nesta escurez.
Cortina de brim caipora,
Com teia caranguejeira
E enfeite ruim de caipira,
Fale fala brasileira
Que você enxerga bonito
Tanta luz nesta capoeira
Tal-e-qual numa gupiara.
Misturo tudo num saco,
Mas gaúcho maranhense
Que pára no Mato Grosso,
Bate este angu de caroço
Ver sopa de caruru;
A vida é mesmo um buraco,
Bobo é quem não é tatu!
Eu sou um escritor difícil,
Porém culpa de quem é!...
Todo difícil é fácil,
Abasta a gente saber.
Bajé, pixé, chué, ôh "xavié"
De tão fácil virou fóssil,
O difícil é aprender!
Virtude de urubutinga
De enxergar tudo de longe!
Não carece vestir tanga
Pra penetrar meu caçanje!
Você sabe o francês "singe"Ivã,
Mas não sabe o que é guariba?
- Pois é macaco, seu mano,
Que só sabe o que é da estranja.
Como dançar o Lundu, dança e canção de
origem africana, pode ser enquisito (pertubador) , mas a tarefa de escritor não
é diferente, tanto uma quanto a outra pode tirar a pessoa acomodada do lugar.
Basta chamar atenção para o diferente, na poesia ou no remexer do corpo, o som
torna-se pujante. Ter a virtude de urubutinga, outro nome para o urubu-rei,
entende o sotaque do caipira, das várias regiões brasileiras. Não precisa ser
índio, vestir tanga para entender o caçanje, português mal falado, mal escrito,
um dos dialetos crioulos falados em Angola. Conhece o Singe, macaco em Francês,
mas guariba, o macaco brasileiro para que? Só sabe o que é da estranja, a
cultura europeia, estrangeira é mais conhecida, inclusive na língua. Uma
mistura de prosa com poesia, linguagem coloquial, sem métrica, cujo estilo mais
livre e solto aproveita para introduzir o assunto do caipira, da fala
brasileira, a miscigenação entre as pessoas, a diversidade e a busca de um
lugar melhor para viver. A vida pode não ser fácil para ninguém, entretanto, a
esperteza é uma saída no enfrentamento de qualquer exploração. Tanta luz nesta
capoeira, outra dança, a dos escravos, que fingiam estar dançando e era uma
luta de defesa pessoal ao algoz , tal e qual numa gupiara, depósito de
sedimentos nas encostas dos morros.
Pode-se dizer, portanto, que
a pesquisa teórica de Mário de Andrade não era a de um colecionador do Brasil e
tampouco a de um folclorista. Pelo contrário, ele pretendia forjar outro
arquivo da brasilidade, refundando-o pela desconstrução do arquivo instituído,
não apenas ao inscrever neste novos enunciados ontológicos, mas principalmente
ao propor-lhe outro princípio nomológico de comando. Recentrando-se agora no
pressuposto anticolonialista do comando e criticando o antigo pressuposto
colonialista, Mário de Andrade participava de um novo projeto nacional popular
para repensar o Brasil a partir da atualidade e com vistas ao seu futuro como
nação.A constituição da problemática dos discursos sobre o patrimônio nacional,
com Rodrigo de Melo Franco, foi o desdobramento desse projeto no plano político
e do Estado. Para isso seria necessário pensar o Brasil como uma 'totalidade
orgânica', isto é, como uma 'nação' propriamente dita e não mais restrita a
certos estados e regiões. Para que se constituísse uma leitura 'universalista'
e não mais 'particularista' sobre a brasilidade, seria fundamental superar os
regionalismos e o seu correlato, qual seja, o discurso do folclore. Apenas
assim a tradição brasileira se poderia efetivamente constituir. (Birman, Joel)
Descortinar a brasilidade fazia com
presteza ancorado na coragem, a partir de Macunaíma afirmou a especialidade.
Determinação indubitável, no momento em que trata a arte e o artista. Infla o
debate estético entre os antigos e os modernos, semelhante ao movimento de
tradição europeia nos séculos XVII E XVIII. Nesta maré modernista, Andrade
almejava ir além da estética. A quebra definitiva dos espelhos fixados e dos
insistentes reflexos desvirtuados do corpo original. O que é do outro é melhor?
Portanto, em Mário de Andrade
a modernidade brasileira seria então impactante, tornando frágeis os nossos
sentidos. Para contornar esse obstáculo, necessário seria então acordar e
despertar nossos espectros e fantasmas, para encantarmos o mundo e a
experiência social com as trilhas e assombrações dos arquivos da brasilidade e
realizarmos assim a construção da nossa tradição a partir dos signos marcados
no inconsciente. Com isso poderíamos ter um futuro possível, retomando as
nossas marcas arquivais para nos direcionar ficcionalmente na fragmentação
presente na atualidade. Foi isso que o modernismo, como movimento do despertar
brasileiro, tentou realizar na Semana de 1922, da qual Mário de Andrade foi um
dos mais importantes arautos. Foi isso ainda que ele procurou realizar pela
retomada dos arquivos (inconscientes) da brasilidade. Por isso tudo, se ele tem
que ser arquivado como um dos rapsodos e como um patrimônio simbólico da
tradição da brasilidade, não se pode esquecer sua lição e sabedoria maior, qual
seja, a de que o arquivo não é 'fato' e tampouco 'documento' a ser embalsamado
como 'monumento', mas sim uma construção sempre móvel e plástica, que se tece
na relação viva da atualidade com o futuro e com o passado. Somente assim o
arquivo poderia ser perpassado efetivamente pela historicidade e ser
matéria-prima e condição de possibilidade da genealogia de uma tradição.
(Birman, Joel)
Entra em cena a concepção de arte, o artista e o
artesão, a arte individualista e contemplativa, a arte pela arte, a arte como
fazer, como prática efetiva de trabalho, a figura do artesão fazendo as vezes
de modelo e paradigma, a artesania, um “métier”, um trabalho, a arte não
confundida com a ocupação das elites desocupadas.
Além disso,
na artesania se condensa a tradição de um métier e
pressupõe-se a idéia de 'trabalho', não sendo então a arte a ocupação de elites
desocupadas, que se podem dar ao luxo onipotente de viver para contemplar o
mundo. Daí porque a própria trajetória intelectual de Mário de Andrade
fundou-se no deslocamento da primeira concepção para a segunda, na qual arte
como fazer e artesania implicaria um compromisso ético e político com a
brasilidade - razão pela qual, me parece, Mário de Andrade passou efetivamente
a assumir cargos públicos no campo da cultura, tanto no governo federal quanto
no estado de São Paulo.(Birman, Joel)
Em uma nota explicativa, em “O Movimento Modernista”
(Andrade, 1974, p. 234), deixa claro a nítida separação, entre um estado de poesia e um estado de
arte. No primeiro o artista escreve sem qualquer tipo de coação tudo o que lhe
chega à mão, como manifestação da “sinceridade do individuo”. Em seguida vem o
momento lento e penoso da arte: a “sinceridade da obra de arte”, coletiva
funcional, bem mais relevante que a do individuo. Desta sinceridade se
ocuparia, independente da fase em que estivesse.
O “descobrimento” propõe o despertar das
consciências adormecidas, publicado em 1927.
Abancado a escrivaninha em São Paulo
Na minha casa da Rua Lopes Chaves
De repente senti um friúme por dentro.
Fiquei trêmulo, muito comovido
Com o livro palerma olhando pra mim.
Não vê que me lembrei que lá no norte, meu Deus! Muito longe de mim
Na escuridão ativa da noite que caiu
Um homem pálido, magro, de cabelo escorrendo nos olhos,
Depois de fazer uma pele com a borracha do dia,
Na minha casa da Rua Lopes Chaves
De repente senti um friúme por dentro.
Fiquei trêmulo, muito comovido
Com o livro palerma olhando pra mim.
Não vê que me lembrei que lá no norte, meu Deus! Muito longe de mim
Na escuridão ativa da noite que caiu
Um homem pálido, magro, de cabelo escorrendo nos olhos,
Depois de fazer uma pele com a borracha do dia,
Faz pouco se deitou, está dormindo.
Esse homem é brasileiro que nem eu.
Esse homem é brasileiro que nem eu.
Para tanto,
precisava jogar água fria nestes anos de sono profundo, decide remexer
no passado, na memória e nos arquivos, no intuito de compreender a tradição. No
ensejo intitula-se “turista aprendiz”, no País natal. O então, etnógrafo, realiza várias viagens “amadoras” iniciadas
em 1925 na companhia dos amigos modernistas e restaura o acervo: afirma que as
línguas em geral “precedem” efetivamente as suas gramáticas (Andrade 1980 a).
Refundar o arquivo brasileiro com fundamento nomológico anticolonial. Portanto,
partiria da construção singular da língua brasileira, diferenciando-se da
língua portuguesa. A poética modernista passa a escrever em brasileiro. Pois, diz Derrida, o arquivo, como impressão, escritura,
não é somente o local de conservação de um conteúdo passado. O arquivamento tanto
produz quanto registra o evento. A estrutura técnica do arquivo arquivante
determina a estrutura do conteúdo arquivável em seu próprio surgimento e em sua
relação com o futuro. Pois a questão do arquivo não é uma questão do passado:
trata-se do futuro, de uma resposta, de uma promessa e de uma responsabilidade
para amanhã. Talvez seja por isso que não dispomos de um conceito unificado de
arquivo: “O arquivo, se queremos saber o que isto teria querido dizer, nós só o
saberemos num tempo por vir”.
Porém, como o ditado popular diz, que de poeta e
louco todo mundo tem um pouco. Tanta teoria deveria ter uma pitada de ousadia.
Supondo isto, o escritor assume uma atitude desvairada diante este acumulo de
teorias e ideias.
Derradeira metáfora à loucura, esta que,
potencializa o primitivo diante do europeu, o civilizado. Em tal fato, a
constituição do arquivo da brasilidade
fica consumado.
Todas as
potencialidades estariam, então abertas para o futuro da tradição brasileira. A
primitividade seria o grande trunfo para a constituição dessa tradição, pois
todos os percursos seriam possíveis a partir dessa virtualidade potente.
(Birman, Joel)
Engenhosidade elevada a enésima potência foi criar o
anti- herói, em uma das suas maiores obras, Macunaíma. Este suposto “herói”
desprovido de caráter porque esqueceu a tradição e o arquivo da brasilidade,
dormia como os outros demais brasileiros.
Macunaíma , foi o contraponto poético das pesquisas teóricas e
críticas de Mário de Andrade sobre a tradição brasileira porque condensa, na
sua escritura, a concepção da tradição forjada pelo autor não apenas na sua
linguagem, que amalgama propositalmente os registros popular e erudito da
brasilidade, mas também nas suas problemáticas, temas e reflexões. ( Birman,
Joel)
"No
fundo do mato-virgem nasceu Macunaíma, herói de nossa gente. [...]
Já
na meninice fez coisas de sarapantar. De primeiro: passou mais de seis anos não
falando. Se o incitavam a falar, exclamava:-- Ai! que preguiça!. . . e não
dizia mais nada.[...]
Quando
era pra dormir trepava no macuru pequeninho sempre se esquecendo de mijar. Como
a rede da mãe estava por debaixo do berço, o herói mijava quente na velha,
espantando os mosquitos bem. Então adormecia sonhando palavras-feias,
imoralidades estrambólicas e dava patadas no ar.
Nas conversas das mulheres
no pino do dia o assunto era sempre as peraltagens do herói. As mulheres se
riam muito simpatizadas, falando que 'espinho que pinica, de pequeno já traz
ponta'."
Seu mais certeiro e derradeiro golpe foi colocar
Macunaíma em um trajeto imaginário para descoberta do Brasil, no entanto quem
descobriu o Brasil?
Mário (s) de Andrade!
Principe Abbas Mirza sconfigge il russo Ashanjdar e le sua truppe. |
Des(umano) Mu(n)do “Maravilhoso” das CibernéTicaS
por Flavia Wass
A BUSCA COMPULSIVA PELA BELEZA TORNA AS PESSOAS MAIS ESCRAVAS DE IMAGENS DO QUE PROPRIAMENTE BELAS POR NATUREZA.
A Criação Michelangelo |
Ter a pressa do coelho da fábula “Alice no País das Maravilhas”, a casa dos “Jetsons”, o milhão do “Patinhas”, o carro do “Batman”, a espada do “He-Man”, pois – “Eu tenho a força!”, ou ser o “super-homem” e a “mulher maravilha”, identifica a era do novo século. Seres performáticos vivendo em um contexto, assumindo características próprias, carregadas de profundos significados. Indubitável os avanços, mudanças, transformações e facilidades quando posso estar confortável em uma cadeira ergométrica, à frente de uma mesa giratória e esticar a mão, pegar uma xícara de Nescafé, Milhos Kelogg`s, ler o jornal impresso ou virtual no micro “computer” portátil, responder mensagens, falar ao celular, sem mover-se quando ouvirmos seu “trimmmm” modificado, vibrante e luzes acendendo. Marcas de uma época, arriscando-se a afirmar que elas “ não apenas suprem o ambiente em que vivo, mas também me envolvem e ao fazerem isto, ajudam a definir quem sou, assim como quem não sou: se eu tivesse que lhe dizer quais marcas evito, você saberia ainda mais sobre mim”. ( Alex Biel)
Contudo, possuímos bens, profissões, boas roupas, cultura e temos acesso direto ao excesso. Acompanhamos as transformações do trabalho, porque nos foi delegada a façanha de sermos mantenedores, na maior parte das vezes aculturados, desta global aldeia “civilizada”, porém enfrentando a crise de identidade aos vinte séculos de idade. Somos o que fazemos, vestimos e ingerimos?
Saudáveis, longevos, sonolentos mal dormidos e hipocondríacos viciados em soluções imediatistas.
De primitivos coletores naturalistas, encontramos outro extremo, os “experts” em números e mais valia.
Em uma definitiva explicação, seria irreversível a idéia de que “ a experiência comum nasce de conhecer o semelhante e seus atos e a eles reagir conforme o modo de ser de cada um. Ao impulso inicial que causa o conhecimento, segue-se logo a reação de quem conhece e que atinge o originador do impulso.
É cibernética social em estado puro – ao processo eletrônico a simples proximidade física dos habitantes da aldeia. E o “feed-back” social é parte do processo integrador de cada um”. ( Mc Luhan)
Então, “ o meio é a massa-gens” cuja, roda é um prolongamento do pé, o livro é um prolongamento do olho, a roupa é um prolongamento da pele e os circuitos elétricos um prolongamento do sistema nervoso central e quando estas relações se alteram os homens mudam”. ( Mc Luhan)
Neste sistema, do capital organizado em hierarquias, seria inútil fazer alguma mudança, ou viver por um ideal. Poucos aventuram-se ou conseguem perceber o quanto “os meio ambientes são invisíveis. Suas regras básicas, sua estrutura penetrante e seus padrões gerais são inacessíveis “a percepção fácil.
O poeta, o artista, o detetive ou quem quer que aguce nossa capacidade de perceber tende a ser anti-social, raramente “bem –ajustados”, não podem seguir as correntes e tendências. Um estranho vínculo existe entre os tipos anti-sociais por sua capacidade de “ver” os meios ambientais como eles realmente são”. ( Mc Luhan)
Afirmativo é ter poder, dinheiro, ego e vaidades. Personas criadas pela cultura ocidental. Objetificadas.
“ O ocidente objetifica pessoas e personaliza objetos. A opulente publicidade dos produtos capitalistas é uma correção apolínea da natureza. As marcas comerciais são células de identidade ocidental.
Nossos reluzentes automóveis cromados, como nossos exércitos de caixas e latas de supermercado, são extrapolações da dura, impermeável personalidade ocidental”. ( Camille Paglia)
Raros são os inconformados com esta sistemática magnânime, magnífica e enigmática, onde o marxismo “ uma fuga à magia da persona” (Camille Paglia) foi um tiro no pé e o trabalhador, ainda é escravo, a massa ignorante, mumificada, histérica e louca.
Vide o industrial de Ford.
“ A imprensa, um artifício duplicador confirmou e prolongou a nova tensão visual. Forneceu a primeira linha de montagem – a produção em massa. Criou o livro portátil, que os homens podiam ler em particular e isolados dos outros. O homem podia, agora, inspirar e conspirar. Como a pintura de cavalete, o livro impresso muito contribuiu para o novo culto do individualismo. O ponto de vista fixo e particular tornou-se possível e a capacidade de ler e escrever conferiu o poder de alienar-se, de não envolver-se”. (Mc Luhan)
Revolução.
“ Mostra que as tecnologias são sempre extensões de nossos sistemas físico e nervoso para aumentar força e velocidade. É disso que nasce a explosão que o mundo sofreu nos últimos séculos até começar sua concentração ou implosão com a eletricidade”. (Mc Luhan)
Taylor, Ford, Fayol, Mayo, Likert, Lewin, Weber, Crozier, Bernard e Simon encabeçaram teorias às pencas e nem a psicologia social de Freud, Jung e Reich conseguiu dizer ser saudável a evolução do trabalho “em série” como prática de sustento.
Ciências Organizativas. “ No mesmo ano em que Taylor e Ford levavam ao ápice a produção industrial americana, na Europa germinavam as sementes de uma sociedade profundamente nova, a sociedade do pós-industrial”. (Domenico De Masi)
Quebrou a bolsa em 1929, os valores, partiram as cabeças, nasce o pós-industrial, movimento com ínício na Europa, mais ou menos trocando alhos por bugalhos ao ignorar sua cientificidade:
“ A sociedade pós-industrial é baseada na produção de massa de bens imateriais (informação, serviços, símbolos e valores)”. (Domenico De Masi)
Valores Industriais: Racionalismo, Standart, Especialização, Eficiência, Piramidal e Concentração.
Valores pós-industriais: Flexibilidade, Criatividade, Intelectualismo, Ética, Subjetividade, Emoção, Androginia, Desestruturação,Virtual, qualidade de vida e híbrida.
Esquizofrênicos ficaremos, caso não fixarmos o que é produzir bens não “tocáveis” como: turismo, esporte, eventos, divertimento e conhecimento.
“ A sociedade pós-industrial assume a complexidade e a descontinuidade.” (Domenico De Masi) Por esta razão, muitas vezes, não sabemos se estamos estudando, divertindo ou trabalhando. O ideal é chegar ao ponto de união das três práticas concomitantemente. Aos pedaços sim! Desestruturados para sempre. Vivendo uma colcha de retalhos eterna. Paralela ao “mercado de ilusões”. Vende-se desejos, trejeitos, estereótipos mal informados e deformados. “O indivíduo pós-moderno é uma colagem de experiências diversas onde todos os pedaços do mosaico devem ser colocados em harmonia entre eles”. (Domenico De Masi)
Vivemos, olhamos e tocamos em caixas elétricas capazes de hipnotizar “seres vegetativos”. Não é à toa que Einstein desabafou:
- “A tecnologia é um machado nas mãos de um psicopata”.
Por horas, a fio elétrico, ficar olhando uma caixa falante, envolto em muros eletrificados de “proteção”, andar sob rodas em outra embalagem “segura”, vestir panos nada confortáveis. Oprimidas vestes em prol da aparência do “status quo” de pertencer a uma “tribo” e sentir-se aceito, mesmo que, violente meu corpo e cometa o ato mais automático de todos os tempos, o de consumir compulsivo e mecânico, com o consentimento da mente.
“ O século vinte não é a era da ansiedade, mas a era de Hollywood. O culto pagão da personalidade redespertou e domina toda arte. É moralmente vazio, mas ritualmente profundo. Não o adoramos pelo poder do olho ocidental. A tela de cinema e da televisão são seus recintos sagrados. O budismo e o cristianismo concordam em ver o mundo material como “samsara” o véu da ilusão.
Mas, o ocidente tem outra tradição, a pagã, que culmina no cinema”. (Camille Paglia)
E o alimentar-se?
De quê?
Sonhos, arte, música, teatro, ler bons livros, informar-se, conhecer e interagir? Antes disto e bem depois pensamos nisto.
Pegar caixinhas em caixotes gigantes. Templo do empanturrar-se. Comidas e alimentos ou primitivos ao extremo ou tão sofisticados a ponto de ser intocável e inacessível. Fora a “bosta” do cachorro abandonado nas ruas, os mendigos e marginalizados, as crianças, os idosos à mercê desta “encenação” patética, mas de estética concebível, para onde vai a nossa “bosta”? Sanear é preciso, ao passo que, viver na merda é impossível.
Cidadanizar quem?
Zumbis amedrontados pelas ciências: da comunicação, da saúde, da educação, das engenharias, das leis e do direito, das herméticas, eréticas BioenergÉticas, que por falar e bem dizer, devemos recriar uma nova Ética:
- Sem torturar o corpo (a cada segundo encontramos uma maneira de fazê-lo)
- Sem máquinas invasivas (plásticas estéticas, aparelhos emagrecedores, próteses).
- Sem energias de guerra ( petróleo, bombas, energias nucleares).
- Sem todo este contexto, capaz de tornar o homem pesado, cabisbaixo e incapaz de olhar para cima.
De uma postura Homo erectus retornará ao estado de Homonóides. “ A cultura pós-moderna é uma cultura que é baseada em duas grandes forças: de um lado o “patchwork” e o híbrido e do outro um sentido a capacidade que a arte e a vida tem. De dar sentido “as coisas que circundam, a começar pelas pessoas.
A força de atribuição a um sentido, de fato, é a assinatura da identidade. Sem qualquer coisa que seja dotada de identidade o indivíduo viveria no perene e uma condição de nômade intelectual.” (Domenico De Masi).
Inverter o perverso quadrado. O envoluído, ver a natureza esfera redonda. Presente dos céus!
O universo pleno. Inteiro. Sermos íntegros e vê-lo na íntegra. Saber que, sim o erétil é capaz de reerguer-se novamente, dar a volta por cima, conectar-se ao todo circunférico, alongar-se, tocar o próximo com a verdadeira energia, usar o telepático cérebro, pleno de sinapses mágicas e dar o célebre salto do desenvolver a única tecnologia capaz de transmutar: o fio sutil da paz, do amor ao próximo, de consciências alertas, ativas, gestálticas, quânticas, qualitativas e cooperativas.
Se assim fosse... “ veja papai, o professor Mc Luhan diz que o ambiente que o homem cria torna-se seu meio de definir seu papel nele. A invenção da tipografia criou o pensamento linear, ou em seqüência, separando o pensamento da ação. Agora, com a televisão e canções folclóricas, o pensamento e a ação estão mais próximas e o comprometimento social é maior. Agora, vivemos de novo numa aldeia. Compreendeu? A nova interdependência eletrônica recria o mundo à imagem de uma aldeia global.”
(Mc Luhan).
Entretanto, duas questões flutuam e pairam sem respostas:
Qual o sentido de uma ciência a serviço de uma minoria?
Ciência não fomenta prosperidade, nem paz e alegria?
Existem dois mundos correlatos e coexistindo, dividindo as opiniões e o senso comum.
Apesar disto, seguem o caminho aos percalços, juntando pedaços rachados e aos estilhaços:
O mundo Natural:
A Natureza, o ético, holístico, solidário, cooperativo, amoroso, um homem ocupado e consciente com o todo. O real. O pensar voltado para o ser, fazendo parte do todo.
O mundo de artifícios e artefatos:
O artificial descoberto através de experiências, o científico, que tudo pode, etnocêntrico, cria a ética do consumo, da violência, da concorrência, do homem pré-ocupado com as orgias energéticas como o petróleo, centrado no homem egoísta, individualista, virtual, frio, robótico e voltado para o ter.
O império tem suas técnicas, quanto a como deixar estas questões, na eterna interrogação.
Será que, alunos de uma universidade pública saberiam responder sobre:
Academia Universitária
A “inteligentsia”, os intelectuais, os cientistas nas suas “torres de marfim” são cooptados a agirem de um modo particular aos debates, referentes à comunidade e aplicação de suas descobertas. Estão acomodados, acima do bem e do mal, vivendo uma espécie de letargia, inconsciente e oportunista.
Assim como, outros segmentos da sociedade: os empresários, políticos e a própria imprensa.
Formando o tripé da ambicionada “sustentabilidade”.
Saúde
A saúde, por incrível que pareça, produz a doença. Hipocondríacos, a compulsiva busca pela “beleza padrão”, a longevidade e o estar “OK” com sua “imagem”. Um reduto que alimenta e perpetua a dor, o sofrimento e a miséria.
A Dor constante dos envolvidos
A massa ignorante, na cultura judaico-cristã sofre, com razão. Pois, não tem acesso e não acompanha os avanços desta ciência tecnológica. Alcoolizados, com fome de tudo, seguem... E os encastelados sofrem desta dor, porque têm medo: - O que vai acontecer quando o meu castelo ruir, por conta do efeito dominó de um sistema preso por um fio?
Que tempo é este
Pós-moderno e pós-industrial onde o flexível tenta imperar. Um novo modelo surge sem retas, somente curvas, sem cartão ponto, sem padrão ou patrão, por volta de tal hora, próximo a algum lugar, deparamo-nos com movimentos sociais, estéticas andróginas, gente criativa e uma humanidade rica por celebrar, rir, brincar, estudar e até trabalhar. Bom seria, se todos entendessem este processo.
Cérebro Humano
E o super-cérebro humano?
Super-Homens?
Sim. Se soubermos, usar toda sua potencialidade será a verdadeira revolução das TIS. Sinapses orgânicas. Conexões mais vivas. Um cérebro da ética, do conforto, saúde, conhecimento, educação, arte e cultura. Com a capacidade de transformar-se, como uma moldura flexível, em volta do corpo, reinventar seu conteúdo a cada movimento e fazer disto sua verdadeira obra de arte.
Afinal, “ A vida é arte”. (Michel Foucault) A comunicação é através da representação, contamos histórias, com metáforas ao longo dos nossos diálogos. Usando da forma, estética, ética, política, enchendo nossos conteúdos, tubos de ensaio, com conceitos, testando o que podem nossos afetos, na dor do real e na ilusão da ciência. Oscilado entre o cartesiano versus o mítico. Experimentando nossos limites. Usando de toda nossa técnica. Podemos até afirmar que “nossa humanidade é técnica por excelência.” (Silvio Meira).
Nem sempre a vemos assim: “ O problema deveria interessar quem quer que decida viver em sociedade, ouvindo-a falar por todas as formas de que ela é capaz. Por que a sociedade, seja de que forma se constituir, ao constituir-se fala. Fala por que se constitui e constitui-se porque começa a falar. Quem não sabe ouvi-la onde quer que ela fale, ainda que sem usar palavras, passa por essa sociedade às cegas: não a conhece: portanto, não pode modificá-la”. (Umberto Ecco)
De novo a diferença está na apropriação e tempo. O tempo, que se perde com coisas e fatos irrelevantes. O que acontece, se enxergarmos tudo somente em linha reta e absorvermos, como uma esponja, esta cadeia de montagem? Qual será o resultado?
Qualidade da Comunicação: Conteúdo, Informação, Conhecimento, Cultura, Conceitos e Significados.
Estética da Comunicação:Ética, Forma, Comportamento e Estilo.
“ A beleza é um acordo entre o conteúdo e a forma”. (Henrik Johan Ibsen)
E na falta de um equilíbrio, o resultado são humanos “bizarros” e deformados. ( Tese da autora no Máster Coor. S3 Studium-Roma)
Isto acontece, porque temos a “mania” de criar mitos: “mitos da beleza”, “mito de ter tempo”, “mito da luxúria e do poder”, “mito da estética e da padronização” e o “mito das mentes brilhantes”, a imprensa chamada de o quarto poder, os publicitários, os cientistas, aos quais, outorgamos e concedemos o direito e o “poder”, para criarem instrumentos afirmativos e utilitários desta cultura do “ter”. “... Conforme começamos assim, prosseguimos...” (Mc Luhan) Seguidores de medidas-padrão. Repetidores. Imitadores como nossos ancestrais, primitivos primatas, lutando por territórios e reproduzindo em ciclos históricos, estéreis estereótipos vazios e arquétipos dos contos de fada. Para que servem ideais, idéias, ideologias, se não criamos novos paradigmas? Não precisamos pensar o que fazer com o nosso “tempo livre”.
Consumir, cometer excessos e produzir toneladas de lixo.
Mudanças são necessárias.
Inverter o ritmo, a velocidade e silenciar as janelas da alma. Somos uma caverna a ser explorada. (Platão) Os computadores fornecem esta dimensão.
A tecnologia sai na frente com as possibilidades. Atrás, vem a sociedade na aplicação, estética, resolução em educar ações.
Redes Ligadas.
Computando:
Cedendo à dor do caos, a transparência e a força da natureza. Ali, está a religião, arte, a mídia reguladora da moral e dos bons costumes. “ A arte é a forma que luta para despertar do pesadelo da natureza.” (Camille Paglia)
Dois pesos e duas medidas:
Um progresso necessário e sem volta. “ O homem nasce livre e por toda parte está acorrentado.” ( Rousseau. Contrato Social, 1762)
Bombas atômicas, barragens energia elétrica, usinas e centrais nucleares, indústria bélica, indústria química e a farmacêutica, petroquímica e a indústria automotiva. Quantas vidas, na natureza, matamos para construir isto?
Caos e impactos da natureza à parte. “ Somos apenas uma dentre a multidão de espécies sobre as quais a natureza exerce indiscriminadamente a sua força. A natureza tem um programa mestre que mal podemos conhecer.” (Camille Paglia)
A estética é explosiva e devemos acompanhá-la. Contorcendo, remexendo as entranhas, invadindo nossos corpos, torturando nossa massa corpórea. E o sexo feminino sofre mais na pele estas conseqüências:
Maquiagens Fantasmagóricas
Escondem seus reais traços e características étnicas e genéticas.
"Corselet" e espartilho
Aperta as costelas, pulmões e prejudica a respiração.
Saltos agulhas nas alturas
Deforma pés, prejudica a coluna e causa instabilidade.
Sutiãs poderosos
Aniquilam com os movimentos naturais causam sensação de falso poder.
Calças apertadas e modeladas no corpo
Limita os movimentos e prejudica os genitais.
Cintas
Usadas para darem a sensação de emagrecimento. Causam prisão e desconforto.
“ Os estragos contemporâneos provocados pela reação do sistema estão destruindo o nosso físico e nos exaurindo psicologicamente. Se quisermos nos livrar do peso morto em que mais uma vez transformaram nossa feminilidade, não é de eleições, grupos de pressão ou cartazes que vamos precisar, mas sim, de uma nova forma de ver.” ( Naomi Wolf)
O duas peças, que libertou a mulher na década de cinqüenta, foi literalmente uma bomba. Um “belo” estigma, para o sexo feminino carregar, habituada a tantos outros.
As mulheres, apesar de reconhecida participação ativa, hoje, em cargos de “poder”, ainda distraem, divertem, trazem dividendos ao mundo masculino. A exemplo do que ocorreu, nas ilhas do atol de Bikini no Pacífico, onde foram desenvolvidos dois grandes testes nucleares. Com a presença de soldados americanos, em 1947 e mulheres trazidas para o seu entretenimento, desfilavam com o que mais tarde transformou-se em ícone de irreverência. Estes humanos passivos e alheios estavam servindo de cobaias aos testes letais radioativos.
Justo o duas peças, o Bikini, que provoca desejos, desnuda pudores, libera dos preconceitos e por outro lado, continuamos produzindo mais guerras, devastando países, expulsando nativos do seu habitat natural, eliminando cidades, abrindo crateras em nome do “desenvolvimento tecnológico”. Mesmo que, para isto, sejamos humanos prostitutas e prostituídos em nome da manutenção deste desastre planetário.
Somente a bomba de atol de Bikini causou estragos?
E os preenchimentos de botox estéticos, a obesidade mórbida, lipoaspirações desastrosas, reduções de estômagos, a anorexia, a bulimia, as plásticas estéticas exageradas, a compulsão ao consumo à padronização e as sociopatias em geral.
Toda esta “ sofisticada” técnica é lógica?
Artigo de conclusão do curso de Ciência, Tecnologia e Sociedade, a qual a jornalista foi selecionada para participar, em 2009, no DPE, Departamento de Pesquisa e Extensão da UFSC/Universidade Federal de Santa Catarina.
Referências bibliográficas:
De Masi, Domenico. Máster Coor. S3 Studium Roma- Itália. L´Università la Sapienza di Roma.
Marshal, Mc Luhan. Co-autor Fiore Quentin “O Meio são as Massa-gens”. Editora Record segunda Edição. Rio de Janeiro. 1969.
Next. Revista trimestral promovida pela cátedra di socologia del lavoro Dell´Università di Roma “ La Sapienza”, pela S3 Studium, pela Formez (centro de formazione studi). Ano seis número dezenove. 2003/2004 Strumenti per l´inovazione.
Paglia, Camille. “ Personas Sexuais: arte e decadência de Nefertite a Emily”. Editora Companhia das Letras. São Paulo.1992.
Ecco, Umberto et alli. “Psicologia do Vestir”. Assírio e Alvim Cooperativa Editora e Livreira. 3ª edição. Lisboa. Portugal.1989.
Wolf, Naomi. “ O Mito da Beleza – Como as imagens de beleza são usadas contra as mulheres ”. Editora Rocco. Rio de Janeiro.1992.
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